Quando me aposentei, pensei comigo mesma: agora vou andar por aí, conhecer lugares que sempre tive vontade de visitar. Imaginei-me andando pelas ruas, conversando com as pessoas, observando seus costumes, assistindo a espetáculos teatrais, saboreando pratos típicos, deslumbrando-me com as diversas manifestações culturais. Selecionei vários roteiros de viagem, programei e realizei algumas delas. É sempre muito bom viajar, não acha?
De repente, todos nós fomos surpreendidos com uma pandemia que tolheu nossa liberdade. Que lástima! Quando viajo, liberto-me de muitas coisas: da rotina, do comodismo, das preocupações e até mesmo das obrigações. De uma certa forma, viajar era um projeto prioritário para mim. Sabe aquela ideia de não morrer antes de conhecer algumas maravilhas do mundo? Confesso que fiquei desalentada!
Depois de alguns meses de pasmaceira, iniciei uma viagem inusitada: “sem lenço, sem documento, nada no bolso ou nas mãos”, segui em direção a mim mesma. Em primeiro lugar, arrumei minha cabeça, já que, numa viagem dessa natureza, ela é a mala que eu não poderia esquecer de forma alguma. Muitos pensamentos vieram à tona: o que faço aqui no meio...
Esta estrofe inicial da música “Cajuína”, de autoria de Caetano Veloso, encerra uma questão essencial à trajetória do homem no mundo. Os filósofos gregos, em especial Aristóteles, e, posteriormente, São Tomás de Aquino, consideravam que todos os seres existem em estado de potência e ato, isto é, trazem consigo as condições de virem a ser. Trazem em si mesmos uma essência predeterminada que pode vir a realizar-se , segundo o fim que lhes é inerente. Por exemplo, uma semente traz, potencialmente, a capacidade de transformar-se numa árvore, uma criança tem em si a potência de ser um adulto. Assim, segundo essa concepção, o ser humano tem uma essência abstrata e universal que o distingue de todos os demais seres: o homem é um animal racional. Tal essência realiza-se, ou melhor, transforma-se em ato pela ação individual de cada ser humano.
Fazendo contraponto à concepção essencialista, o existencialismo do século XIX nega que a ação humana seja predeterminada por essa essência abstrata e universal, afirmando que a existência precede a essência. Isso significa dizer que o...
“Et si tu n’existais pas Je ne serais qu’un point de plus Dans ce monde qui vient et qui va Je me sentirais perdu J’aurais besoin de toi Et si tu n’existais pas Dis-moi comment j’existerais Je pourrais faire semblant d’être moi Mais je ne serais pas vrai”
Todo amante da música romântica francesa dos anos 70 já ouviu essa canção, na voz do cantor franco-americano Joe Dassin: “Si tu n’existais pas”.
Embora se trate de uma declaração de amor, as estrofes destacadas acima nos remetem a uma reflexão sobre a singularidade da relação entre um eu e o outro. Elas nos falam do significado da existência do outro em nossa vida, a tal ponto que, sem o outro, não somos ninguém, perdemos a nossa própria identidade.
Estaremos nós conscientes da real importância dessa relação nos dias atuais? Quem és tu (o outro) e o que representas em minha vida? Eu sou o outro na tua vida, mas o que significo para ti? Ao usarmos esses dois pronomes pessoais (“eu” e “tu”), indicamos que há uma relação de proximidade entre duas pessoas. Não se...
O medo excessivo é um sentimento que nos paralisa. Desorganiza nossos pensamentos, impede-nos de analisar a realidade, fragiliza nossa capacidade de reflexão, dificulta a nossa socialização, enfraquece a nossa confiança, atrapalha as nossas decisões.
Há muitos anos, sofri de síndrome do pânico. Abruptamente, sem nenhum motivo aparente, uma sensação de quase morte invadia meu espaço interior e me fazia pedir socorro a qualquer pessoa próxima a mim. Tinha medo de dirigir, medo de ficar sozinha em casa, além do medo terrível de morrer, é claro. Como a situação ficou insuportável, iniciei um tratamento com medicamentos e sessões de psicoterapia. Mas permanecia muito insegura e sofrendo com os efeitos de psicotrópicos.
Certo dia, tomei conhecimento de um livro de uma autora maranhense, cujo nome não me recordo agora. O título chamou minha atenção: “Yoga para Síndrome do Pânico”. Dediquei-me a lê-lo e a praticar suas orientações, que se concentravam no exercício da respiração. Nesse momento, iniciei meu processo de cura. Fiz outras leituras e passei a frequentar aulas periódicas de Yoga. Considerando meu crescente interesse sobre o assunto, resolvi fazer um curso de...
Em janeiro de 2021, em meio a uma pandemia que permanece assustando o mundo inteiro e uma crise política sem precedentes na história do nosso país, completei 72 anos. Jamais imaginei chegar ao outono de minha vida numa situação dessa natureza. Tomada por um medo coletivo da morte, perplexa com os acontecimentos não só de meu país, mas do mundo todo, vieram-me à memória dois livros incríveis que li, de autoria de José Saramago: “Ensaio sobre a cegueira” e “Ensaio sobre a lucidez”. No primeiro ensaio, a população da capital de um país imaginário é consumida por uma cegueira branca que vai acometendo cada pessoa a ponto de provocar um verdadeiro caos na vida da cidade. No segundo, as pessoas voltam a enxergar e, no dia das eleições, a maioria delas vota em branco. Pelo que sei, Saramago tinha não apenas uma forma totalmente original de escrever, mas também uma capacidade fantástica de olhar a realidade à sua volta e interpretá-la com uma crítica sagaz e impactante.
Por que me lembrei desses livros? Eu os li há muitos anos, mas eles revelam com perfeição...